Sunday, December 02, 2018

Despedidas temporárias

Um abraço forte e apertado. Brincadeirinhas ao pé do ouvido, risadas bobas. Outro beijo no rosto. Desenrolaram-se, se olharam nos olhos. Um beijo tímido, outro abraço apertado. Uma pergunta foi o suficiente para se soltarem. As palavras jorraram dos mesmos lábios que tinham acabado de beijá-la. 

De repente, o distanciamento. Diferentes desejos. Pensamentos confusos.

Os mesmos lábios que diziam não ter mais vontade, encostavam nos lábios dela segundos depois.

- Tchau.
- Tchau, me avisa quando chegar em casa?

Ela não olhou para trás.

Friday, February 02, 2018

Sobre sintomas de saudade

Tenta fingir que hoje é um dia como outro qualquer, mas, por mais que insista, não consegue se enganar tão fácil assim. É inevitável não pensar nele e em todos os "começos" e possíveis significados que esta data lhe traz. Não consegue esquecer.

Não consegue esquecer também o seu olhar, o seu jeitinho tímido, aquele seu sorriso de canto de boca. Não consegue esquecer do dia que ele foi até o hospital só pra fazer companhia e segurar a sua mão (e a sua bolsa... rs). Não consegue deixar para trás a sensação boa do seu toque, do seu cheiro e da sua barba.

A verdade é que ela ainda não se acostumou com a ausência dele em sua vida. Sente falta das conversas, das brincadeiras, das intimidades, da parceria. Em alguns dias chega a sentir o cheiro dele por entre os lençóis da sua cama. Em outros, apenas o procura com os olhos no lugar onde eles sempre costumavam se encontrar no início do dia, só para ter a certeza de que ele não está. E dói não vê-lo mais...

Ainda é dolorido pra ela o fato de eles não se falarem mais; de ela não mais poder contar com ele e/ou contar para ele sobre todas as coisas que têm acontecido ultimamente. Detesta a distância física que hoje os separa, os fusos horários diferentes e, principalmente, os desentendimentos idiotas. Às vezes, lê trechos das suas conversas de meses atrás só para matar um pouquinho da saudade e dar risadas com as hashtags e fotinhos engraçadas que eles trocavam.

Enfim, apesar de todos os desentendimentos, desencontros e dores, ela continua apoiando a decisão dele de ir em busca dos seus sonhos, do seu caminho. Ele está passando pelos seus processos. E ela sabe que esta será uma experiência única e inesquecível para a vida dele.

E, assim, vai deixando o tempo passar, vivendo um dia de cada vez, esperando que tudo isso passe. Ainda assim, sente saudade dele todos os dias. E sente amor, apenas amor.

Wednesday, January 10, 2018

(Re)começo

(*) arquivo pessoal, 2017
Cansou. Cansou de sempre ser a mesma pessoa. De sorrir quando não está com vontade. De ser exatamente aquilo que todo mundo espera dela. Cansou de ser obediente, certinha, de ter horário pra tudo, de fazer tudo da forma como sempre fez. Cansou da agenda cheia de compromissos, de ter que responder mensagens o tempo todo, de ter que falar com os outros quando, na verdade, quer ficar no seu canto, em silêncio. Cansou de fingir que está tudo bem, de ver coisas com as quais não concorda, de levar um estilo de vida que não condiz mais com as suas crenças.

Um novo ano se inicia, mas, para ela, tudo continua no mesmo lugar. Tenta se levantar, mas a cabeça pesa; o corpo não responde. O coração palpita. Tenta se reorganizar, organizando contas, relendo cartas antigas, jogando fora papéis e objetos. Dorme, assiste filmes, se espreguiça, lê, tenta ordenar os pensamentos, chora, acende velas. Molha as plantas. Se isola do mundo, se isola de tudo. A vida anda morna demais, chata demais, sem graça demais e ninguém vai entender. 

A verdade é que ela não quer lidar com nada e nem com ninguém. Não quer falar e também não quer ouvir. Quer pensar, sozinha, sobre o que fazer, qual passo dar e como será daqui pra frente. Quer ser mais leve, menos exigente, mas só consegue se apegar cada vez mais nas miudezas do dia-a-dia. Fica triste, desolada... frustrada. Não entende os porquês. Respira.

Sente-se perdida. Quer encontrar respostas, possíveis caminhos. Quer leveza e sabedoria. Quer encontrar o que a fará feliz sem que haja prazo de validade. Não se importa em ir ou em ficar, desde que seja a melhor saída para a sua vida. Está em uma busca infinita - mais interna que externa -, procurando encontrar o que realmente alimenta a sua alma, o que faz sentido, o que lhe traz o mínimo de equilíbrio.

Precisa de espaço. Precisa de silêncio. Quer enfrentar seu caos, frente a frente, sozinha. Arranja forças para continuar na estrada, mas no seu tempo, do seu jeito. Quer tentar ouvir e absorver todo o seu barulho interno. Quer (re)começar, de alguma forma, a caminhar com as suas próprias pernas.

Sentada na sua poltrona chora mais um dia.

Saturday, December 17, 2016

O andarilho

Ele estava ali, parado na frente de um hostel qualquer, esperando. De um lado, seu violão dentro da capa preta, apoiado na parede. Sobre o vão da janela, uma garrafa de vinho aberta. No vão entre o vinho e o violão, estava ele, com o seu celular na mão, esperando ela chegar.

(*) Foto: "O sol e as sombras"
(gentilmente cedida pelo querido António Delicado)
A rua estava um pouco escura, mas, ainda sim, ela o reconheceu de longe. Achava que o encontro seria, no fim, um grande desencontro... mas, para a sua sorte, estava enganada. Eles se resolveram com poucas palavras e lá estava ela andando no seu ritmo usualmente acelerado para encontrá-lo.

Abraçaram-se com um abraço quentinho como se não se vissem há tempos (quando, na verdade, estavam separados há apenas uma tarde). Fazia muito frio naquela noite. Ela havia subestimado o frio; ele, por sua vez, usava um poncho. Caminharam lado a lado até a pracinha da cidade, conversando, sem pressa.

Quando chegaram, ele deixou o violão de um lado e a garrafa de vinho de outro. Ela descruzou os braços, tentando decifrar o que aconteceria em seguida. Quando finalmente ficaram frente a frente, trocaram olhares. Ele, então, a puxou pela cintura e a beijou com um beijo gostoso, sem pressa.

Conversaram sobre a vida, viagens, loucuras, limitações, família, expectativas... o frio fazia com que os dois ficassem cada vez mais próximos. Ele, preparado para a noite fria; ela se aninhando embaixo de parte do seu poncho. Suas mãos se encontravam e desencontravam, como deveria ser. A mão dela encontrava a barba dele enquanto a mão dele procurava o seu cabelo escondido sob o capuz. A expectativa criada antes de cada beijo causava arrepios. Uma tensão gostosa fazia com que eles tivessem cada vez mais vontade de estarem perto um do outro, assistidos apenas pelo céu cheio de estrelas. 

Entre um assunto e outro, se beijavam. Ele estava vivendo longe de casa, por opção própria. Ela só tinha aquela noite antes de voltar para a sua casa, também por opção própria. Naquela praça, em meio ao vinho, às palavras soltas ao vento e às pessoas que ali passavam, ela ouviu coisas que a fizeram refletir. Ele falava coisas que a interessavam. Ela o escutava atentamente e, de vez em quando, deixava seu ombro para olhá-lo com certa admiração. No seu íntimo, ela o achava corajoso demais por se aventurar daquela maneira, ainda que por tempo determinado.

O frio aumentava. Os corpos se entrelaçavam um ao outro cada vez mais. Ele exalava um cheiro bom de homem, de boas energias, de aventuras por vir. Ela exalava um cheiro bom de mulher, de redescobertas, de conquistas, de vontades.

Saíram da pracinha principal da cidade, de braços dados, caminhando pelas ruas de terra. Ele despertou nela vontades até então adormecidas; sede por aventuras, coisas novas. Ela, por sua vez, não queria que ele fosse embora. Queria que ele ficasse mais, que a noite não acabasse.

Ficaram juntos por mais tempo que ela imaginava (e menos do que gostaria). Ao se despedirem, trocaram beijos, carinhos, palavras e olhares. Como se já se conhecessem há tempos. Como se já tivessem percorrido todo aquele trajeto inicial de se conhecer alguém, sem que o estranhamento tivesse, de fato, acontecido. Sem falsas promessas, sem enganos passageiros.

Ele saiu caminhando pela rua de terra, naquela escura noite de segunda-feira. Andarilho, sozinho, foi ganhar e desbravar as novas estradas que a vida queria lhe apresentar. Carregava sua garrafa de vinho de um lado, seu violão de outro, o sorriso fácil no rosto, o coração cheio de amor e um monte de sonhos na cabeça.

Ela ficou parada no portão por mais alguns segundos, apenas assistindo-o ir, com vontade de pedir para ele ficar. Só mais um pouco. Só mais um gole. Talvez mais uma música. No entanto, já era tarde, já não havia mais volta. Abriu o portão para a sua antiga realidade, sem deixar de carregá-lo em sua memória e em seu coração.

Monday, May 02, 2016

E agora, Fernanda?

E agora, Fernanda?
O tratamento acabou,
a rotina recomeçou,
a vida seguiu,
a história ficou,
e agora, Fernanda?
e agora, você?
você que não sabe pra onde ir,
o que fazer,
você que sorri,
que ama, brinca?
e agora, Fernanda?

(trecho adaptado e, claro, sem qualquer pretensão de comparação, do poema de Carlos Drummond de Andrade: "José")

"Em pensar que a essa hora, no ano passado, não tinha um fio de cabelo nessa cabeça e hoje... olha como está cabeluda". Verdade, estou cabeluda, cheia de cachinhos - que ora me irritam, ora me divertem -, mas os cabelos são apenas a pontinha do iceberg que mora em mim. Já faz um tempo que venho pensando sobre o que tem acontecido na minha vida desde o ano passado. O tratamento acabou. A vida seguiu seu rumo. As coisas estão meio que voltando ao normal. E as pessoas, com certa frequência, me perguntam "como você se sente?", "agora tá tudo bem, né?" e eu, sozinha com os meus inúmeros pensamentos, não canso de me perguntar "E agora, Fernanda?"

Eu me pergunto isso, pois confesso que, por diversas vezes, me sinto um pouco mais perdida que o normal. "Normal" porque acho que, assim como eu, independente de doença ou não, todos nós nos deparamos com momentos de dúvida durante a vida. No meu caso específico, passei por um tratamento pesado e cheio de limitações e, por algum motivo desconhecido, pensei que, ao final, tudo ia mudar: que não ia mais repetir os mesmos "erros" do passado; que tinha aprendido tantas coisas; que não ia deixar mais que as pessoas se aproveitassem da minha boa vontade; que não ia mais trabalhar como antes; que ia voltar a fazer aulas de francês/jazz/natação; que, que, que... e por aí vai. No fim, acabei percebendo que as coisas realmente não são tão simples assim.

Percebi que não é porque abri as portas das reflexões internas que tudo se resolverá com um passe de mágica. As questões mudaram, é verdade, mas ainda existem e estão aí (e eu chego até a duvidar que algum dia elas acabarão). As questões são outras porque a vida é outra. A cada vez que me perguntam "mas o que mudou?" eu repito a pergunta pra mim durante dias e sempre encontro respostas diferentes.

Muitas coisas mudaram, sobretudo dentro de mim. A rotina, entretanto, voltou e, com ela, as preocupações, a vida no automático. Quando percebo, lá estou eu repetindo tudo aquilo que eu prometi pra mim que não faria mais. Lá estou eu trabalhando até tarde, adiando exame médico, me doando para coisas que deixaram de ser tão importantes para mim. Por outro lado, ainda que a vida tenha voltado a esse ponto "automático", o olhar passou a ser diferente. Hoje eu ao menos consigo distinguir o que funciona ou não funciona mais pra mim. Mais que a distinção, passei a assumir as minhas vontades, deixando um pouco o medo de lado, e "só" isso já faz uma baita diferença na minha vida. Claro que acabo sendo obrigada a fazer coisas que não gosto, afinal, faz parte da vida, mas acho que só de ter a consciência do que é bom ou não pra mim, já é um grande passo.

As mudanças vêm ocorrendo em doses homeopáticas. Eu percebo em mim uma permissividade e aceitação que antes não existiam. Eu tenho me permitido sentir mais, ser mais aberta com as pessoas, compartilhando um pouco do que eu sinto e das minhas vontades. Também acredito que eu passei a me olhar com mais amor e aceitação. É fácil? Nem um pouco. Acaba sendo um exercício diário, principalmente para uma pessoa que, assim como eu, nunca teve esses "auto-olhares". No entanto, nessa caminhada, eu venho percebendo o quanto toda essa bagunça na minha vida tem sido fundamental para eu fazer uma faxina interna e começar a notar o que, de fato, me traz felicidade, vivendo com paciência; um dia de cada vez.

Talvez as mudanças tenham que ocorrer em doses homeopáticas mesmo para que eu possa me acostumar com toda devastação que o furacão deixou pra trás. E eu não reclamo. Como já disse antes, acredito que nada acontece por acaso e comigo não ia ser diferente. A doença, o tratamento e o sofrimento passaram, mas a vida não. A vida continua aqui, se reconstruindo dia após dia.

E agora, Fernanda, o que será do amanhã? Não faço ideia, mas ando me esforçando para viver o hoje da melhor maneira possível. Que a vida é feita de escolhas, a gente já está cansado de ouvir (agora não posso mais fazer a piadinha infame "já está careca de ouvir"... hehehe), mas, apesar de clichê, é a mais pura verdade. O amanhã a gente se preocupa quando ele chegar. Hoje eu só escolho ser feliz!




Tuesday, November 24, 2015

E o pulso ainda pulsa...

"Achava que íamos conversar sobre a cirurgia para tirar o nódulo de 5,5 cm que eu tenho no seio esquerdo, porém eu estava enganada. Meu nódulo foi diagnosticado como um tumor maligno. (...) It is what it is. Agora é buscar uma solução para o problema!"(*)

Há um ano atrás eu perdi o chão sob os meus pés. O mundo girou e eu continuei ali, parada, sem saber o que fazer ou pra onde ir. Há um ano atrás eu senti o verdadeiro gosto amargo na boca. Os ouvidos se tamparam, as palavras silenciaram ao passo que a cabeça não parava de funcionar; não parava de pensar. 

Há um ano atrás, em uma segunda-feira de novembro, eu descobri que tinha um câncer dentro de mim. Como se eu tivesse me atirado em uma piscina sem qualquer proteção, com o nariz tampado e de olhos fechados, senti aquele silêncio dentro da água. Sensação de vazio... "é comigo mesmo?". Um instante de silêncio seguido de um turbilhão de pensamentos e medos. Naquele momento, só conseguia ouvir o barulho alto das minhas perguntas. As mãozinhas da minha mãe seguravam a minha, mas eu não conseguia compreender o que estava acontecendo ali.

Parecia que não era comigo. Aliás, para ser sincera, às vezes ainda fecho os olhos e parece que nada aconteceu comigo nesse último ano... parece que vou acordar a qualquer momento e perceber que nada disso aconteceu de verdade e que foi só um sonho esquisito. No entanto, quando olho para a imagem refletida no espelho, vejo uma pessoa diferente e me dou conta de que foi real, de que tudo aconteceu comigo e que eu já não sou mais a mesma pessoa de antes.

É estranho como o controle (ou a ideia dele) sobre a nossa vida, de repente, escapa das nossas mãos e percebemos que não somos nada além de humanos. Humanos que estão sujeitos a qualquer coisa a qualquer momento. 

Há um ano atrás, talvez escondida na minha prepotência disfarçada, eu realmente acreditava que aquele nódulo era só um nódulo e nada demais. Fui para o consultório do médico certa de que após mais alguns exames marcaríamos uma cirurgia simples e que logo aquele caroço estaria fora de mim. Inocência ou ignorância, não sei, só sei que não imaginei que isso poderia acontecer comigo e muito menos daquela maneira. 

E um ano se passou desde que saí do consultório do Dr. Ginecologista impedida de enxergar o chão embaixo dos meus pés por conta das lágrimas que insistiam em cair dos meus olhos. E no espaço desse "um ano" tantas outras lágrimas foram derramadas, mas muitos sorrisos também iluminaram meus dias. Tantas reflexões, tantas confusões de sentimentos, tantas vontades que nem que eu quisesse conseguiria enumerá-las. Ainda que já tenha se passado um ano, tantas coisas aconteceram que ainda não consigo reconhecer tudo. Nem mesmo aquela imagem refletida no espelho eu ainda consigo reconhecer por inteiro. Consigo enxergar uma mulher com alguns quilinhos a mais, com os cabelos curtos e cheios de cachinhos involuntários, mas que eu ainda não sei se sou eu. Uma mulher que, apesar da minha dificuldade em reconhecer, passou a enxergar a vida com lentes de aumento, tentando atribuir o real valor às coisas que realmente importam. Enxergo uma mulher que se permite sentir a tristeza, a dor, a solidão, a dúvida, o medo, mas que também se permite sonhar, em meio a todas dúvidas, com uma vida melhor e mais significativa. Uma mulher que permite receber ajuda do outro, o amor e carinho incondicionais dos que a cercam. Uma mulher que se permite sorrir quando quer sorrir e que, acima de tudo, se permite chorar, sem medo ou culpa, quando quer chorar. Uma mulher cujo maior medo é de voltar a ser, simplesmente, o que era antes, mas cuja maior vontade é de viver, cada dia de uma vez, como se não houvesse amanhã.

(*) trecho do meu diário datado de 24 de novembro de 2014.

Saturday, May 16, 2015

*** Felicidade sem fim! ***

(*) Chorando de alegria!
Nunca imaginei que um dia eu ia ser invadida por uma felicidade tão verdadeira (e nada clandestina! hehe). Um sentimento delicioso tomou conta de mim desde a última quinta-feira, dia 14 de maio de 2015. Esse dia tem um significado MUITO especial para mim. Especial, pois uma etapa do meu tratamento acabou. Uma etapa dolorosa, cheia de percalços, altos e baixos, mas ela ACABOU. Ainda terei os efeitos colaterais dessa última dose de químio, mas quem se importa? Serão os últimos efeitos colaterais causados por quimioterapia. Últimos. Não, eu ainda não estou acreditando nisso. E cada vez que penso, só consigo sorrir e sentir uma leveza enorme. Sinto vontade de gritar para o mundo que eu estou livre da quimioterapia. Sei que não temos certeza de nada nessa vida, pois tudo acontece por algum motivo, mas, ao mesmo tempo, dentro de mim tenho tanta certeza que nunca mais precisarei passar por isso que nem sei como explicar. Claro que se tiver que passar de novo, vestirei as minhas armaduras junto com o meu mais lindo sorriso para encarar tudo de frente, mas isso não vai acontecer... tenho muita vida para viver ainda. Tenho muito o que aprender e não quero mais aprender pela dor. Quero apenas aceitar, confiar, entregar e agradecer!

Hoje, mais do que nunca, a minha felicidade transborda junto com as minhas lágrimas da mais pura alegria e amor. Estou tão emocionada e feliz que nem tenho conseguido responder mensagens sem chorar um pouquinho! hehehe... Vontade de sair abraçando todo mundo que esteve por perto seja fisicamente, seja por meio de mensagens, de pensamentos, de vibrações, de orações, de mimos, de flores, de palavras... enfim, não importa como, mas sempre se fizeram presentes de alguma maneira e eu recebi tudo de braços e coração abertos. Vontade de distribuir sorrisos, de olhar nos olhos e de agradecer muito a cada um por toda força, por todo amor, por todo carinho, por todo apoio. A guerra ainda não acabou, mas o importante é que eu vou comemorar cada etapa e cada batalha vencida em busca da cura!!!

Gratidão imensa! Felicidade sem fim!

Sunday, March 22, 2015

Cabelo, Cabeleira, Cabeluda, Descabelada

Estávamos passando alguns dias em Embu-Guaçú logo no início do ano novo. Meu oncologista - Dr. (querido) Daniel - já havia me alertado sobre a alopecia (ou queda dos meus fios de cabelo): a partir do 15o. dia após a primeira sessão de quimio o couro cabeludo começará a doer e o cabelo começará a cair. Pelas minhas contas, o tal 15o. dia cairia exatamente no dia do meu aniversário, 1o. de janeiro (baita presente!). Pois bem, como esperado, no dia 31 de dezembro tive uma dor de cabeça bem chatinha acompanhada de dor no couro cabeludo. Não é uma dor insuportável nem um bicho de sete cabeças, mas dor é dor. Pode ser comparada à dor que segue penteados bacanas pós-casamento: depois que a festa acaba, o couro cabeludo reclama. A dor é bem semelhante a essa!

No primeiro dia do ano, conforme previsto, minhas madeixas começaram a cair. No início, foi uma queda um pouco "tímida". Caía um tufo aqui, outro ali, nada demais. Já no dia seguinte, a queda aumentou consideravelmente. Ao acordar, percebi que meu travesseiro e meu pijama estavam cheios de fios. Durante o dia, eu ia deixando fios por onde quer que eu passasse na casa. "Não fica passando a mão no cabelo", minhas irmãs insistiam, mas era como se falassem para a criança não pegar mais balas do baleiro cheio, ou seja, de nada adiantava. Quanto mais eu passava a mão na minha cabeça, mais tufos grossos de cabelo saíam nas minhas mãos. Fiquei imaginando como teria sido caso eu não tivesse cortado meu cabelo curto dias antes.

Fui para o banho e, ao sair do chuveiro, uma bola de fios de cabelo saiu comigo. Pedi uma escova emprestada para a minha mãe. Enquanto eu me olhava no espelho do banheiro, meus cabelos se emaranhavam cada vez mais na escovinha. Eram muitos e eu não tinha muito o que fazer. Foi deprimente ver meu cabelo caindo daquele jeito. Na medida em que passava a escova no meu cabelo, minhas inevitáveis lágrimas escorriam pelo meu rosto. "Mãe, hoje é o último dia que eu penteio meu cabelo". "O último dia dessa fase, filha!". "Sim, o último dia dessa fase, mas é o último dia".

A casa estava cheia aquele dia e eu preferi não deixar nossos convidados para ir ao centro da cidade com a minha mãe. Estava decidida, mas sabia que precisava fazer as coisas no melhor momento. Sendo assim, combinei com a minha mãe de irmos ao centro da cidade no dia seguinte. Esperei o sábado chegar (dia seguinte), acordamos, tomamos café, peguei o lenço que eu tinha comprado no natal para a ocasião e fomos de carro para o centro procurar uma cabeleireira disponível. Da janela do carro, os fios que ficavam entre meus compridos dedos eram levados pelo vento.

Tentamos o salão de cabeleireiras que minha mãe conhecia, mas estava fechado. Na mesma rua, um pouco mais à frente dali, encontramos um salão pequenino, de portas envidraçadas e paredes roxas. Uma mulher (que parecia ser a cabeleireira) estava sentada na cadeira para atender os clientes, como se estivesse esperando alguém chegar. Pedi para a minha mãe estacionar o carro e, em seguida, fomos até o salão. Além da mulher que vimos lá logo que entramos no salão (que, de fato, era a cabeleireira), havia outras três mulheres: uma recepcionista, uma manicure e uma cliente fazendo as unhas. Conversei com a cabeleireira para saber se ela podia me atender naquela hora para cortar o meu cabelo:

- ... na verdade, é mais simples do que isso: quero raspar a cabeça.
- Mas você tem certeza de que você quer raspar esse cabelo lindo?
Sim... eu PRECISO.
- Hmmm... ok. Veja com aquela moça ali (a recepcionista) que, se eu não tiver ninguém marcado agora, eu posso te atender.
- Ok.

Enquanto fui perguntar à moça sobre a disponibilidade da cabeleireira, ela saiu do salão para cumprimentar uma amiga lá fora. Sentei na cadeira e esperei a cabeleireira voltar. Olhei para o espelho que estava na minha frente, tentando capturar, uma última vez, a minha imagem com aquela carinha e aqueles cabelos. Eu sabia que não tinha muito mais o que fazer, estava determinada.

- Posso te perguntar o porquê você precisa cortar os cabelos?
- Porque eu estou doente.
- É muito grave?
- Sim, é câncer.
- Vai ficar tudo bem.
- Dói muito? Porque meu couro cabeludo está dolorido.
- Não dói nada!

E assim, com sua mão esquerda sobre a minha cabeça, como se fizesse um carinho, ela começou a passar a maquininha com a mão direita. Realmente não dói nada. Como em uma orquestra, as lágrimas caíam junto com os cabelos. Minha mãe permanecia em pé ao meu lado, mas eu não tive coragem de olhar pra ela nem por um instante. Olhava firme para o espelho à minha frente.

Logo na primeira consulta com o Dr. (querido) Daniel, ao falar sobre o tratamento e todos os seus efeitos colaterais certeiros, ele mencionou a possibilidade de eu usar perucas. Havia falado sobre uma senhora que produziria uma peruca tão perfeita e tão fiel ao meu "cabelo de verdade" que ninguém ia perceber. Ainda sim, eu não quis. Não quis porque, dentro de mim, eu sempre ia saber que estava vivendo uma mentira. Não quis porque achei que fosse ficar estranho. Não quis porque achei que devesse enfrentar tudo de frente e da forma mais verdadeira que eu encontrasse. Enfim, não quis por "n" motivos. No entanto, teve um dia que eu pensei em colocar a peruca: um dia em que estava pensando como seria o retorno para o escritório e como seriam todos os olhares estranhos pra mim. Fossem de estranhamento, de pena, de surpresa, eu não queria enfrentá-los e pensei que a peruca fosse uma boa saída pra isso. Além disso, achei que eu fosse ficar feia, que ninguém mais fosse olhar para a Fernanda como ela sempre foi e sim, como uma outra pessoa. Nesse dia conversei com uma das minhas grandes amigas que, inclusive, passou por isso com uma pessoa muito próxima da sua família. Ela imediatamente me puxou pra realidade:

- VOCÊ ACHA QUE VAI FICAR FEIA?
- Acho...
- Não vai não.

E começou a me mostrar contas do instagram de outras mulheres que passaram/estavam passando pelo mesmo tratamento ao qual eu estava me submetendo. Mulheres que, assim como eu, estavam indo para a academia, correndo, malhando e supreendentemente carecas. E lindas. E cheias de força. E determinadas. E com vontade de viver.

- Mas como vão olhar pra mim no escritório? Eu não quero receber olhares estranhos só por conta da minha falta de cabelos na cabeça.
- Ah então você quer usar perucas por causa dos outros? Se você quiser usar peruca por SUA causa, porque vai se sentir melhor, aí tudo bem... mas pelos outros? Oi? Olhares "diferentes" você vai receber com ou sem peruca por "n" motivos. Aí vai de você saber lidar com isso, oras. Mas não faz o menor sentido você fazer alguma coisa porque os OUTROS vão te olhar diferente.
- É... você tem toda razão.

Nunca mais pensei em colocar uma peruca. E, no fim, ainda bem que não gastei dinheiro mandando fazê-la porque o calor que fez nesse 2015 não estava escrito em nenhum gibi. Passei tanto calor de lenço, imaginem se eu usasse a tal peruca!!!

A cabeleireira terminou de raspar minha cabeça e eu até que não fiquei parecendo o monstro do lago Ness ou qualquer outro bicho horrendo. Eu continuava sendo eu, só que com um peso a menos na cabeça (literalmente). Meu couro cabeludo já não doía e as lágrimas já tinham secado há algum tempo. Minha mãe se aproximou para me dar o lenço, "se você quiser, eu raspo meu cabelo agora. Sento aí e peço para ela raspar minha cabeça também". Não, mãe, não precisa. "Tem certeza, Fê? Porque se você quiser eu raspo e fico igual a você". Tenho certeza, mãe, não precisa cortar o cabelo. Ela então pegou um tufo de fios caído no chão e colocou na bolsa "de lembrança".

Quando levantei, as outras três moças estavam olhando pra mim. Olhos arregalados, não emitiram qualquer som. Eu, em contrapartida, peguei o lenço na mão, mas não o coloquei na cabeça. Pagamos e fui me despedir da cabeleireira. Ela era baixinha, de cabelos escuros. Estava visivelmente emocionada. Perguntei o seu nome (Lú), nos abraçamos "vai ficar tudo bem! Vou ficar te esperando para fazer um corte de cabelos de verdade". Pode deixar que eu volto!

Amarrei o lenço no shorts e saí do salão de cabeleireiras. Acabei me sentindo mais leve, menos tensa... pronta para enfrentar o mundo com o meu novo visual.



"Cabelo quando cresce é tempo". (Cabelo, Gal Costa)

Wednesday, December 31, 2014

Ah... 2014!

Último dia do ano. Último dia do meu ano pessoal (estou me despedindo oficialmente dos 32 aninhos...). 2014 foi um ano intenso. Um ano atípico, de "primeiras vezes": primeira vez que tive um "quórum" considerável de amigos comemorando meu aniversário no fatídico primeiro de janeiro; primeira vez que tirei todas as férias acumuladas que eu tinha na vida (e as não acumuladas também); primeira vez que fiz mais de uma viagem internacional em um ano (yay!); primeira visita ao Mercado Municipal de São Paulo (é, pois é.. hehe); primeiro ano que "fiquei de castigo" em casa por tanto tempo por motivos de saúde (na verdade, por falta dela) e por aí vai.

Passei um tempo fora do escritório, que, na verdade, começou em 2013, mas, basicamente, teve sua passagem maior por 2014. Fui trabalhar na área jurídica de um banco, aprendendo um outro lado da profissão que eu escolhi para a vida. Nesse caminho, conheci pessoas maravilhosas com quem tive a oportunidade de conviver diariamente. Aprendi muito nesses tempos e fiz amizades para a vida inteira.

Conheci novos pedacinhos da terra do meu pai ao lado de uma das melhores companhias do mundo - minha irmã do meio. Revisitei a linda e inesquecível cidade londrina e finalmente conheci Praga (encantadora, como não poderia deixar de ser). Viajei para Boston com as "minhas crianças" que, além de não serem "minhas", de "crianças" não têm nada! hehe... Uma viagem deliciosa com novas experiências e pessoas bacanas. E, por fim, porém não menos importante, tive a oportunidade de conhecer a cidade que nunca dorme: Nova Iorque! Cidade grande, com um infinito de possibilidades a serem exploradas. O sentimento que fica é o de querer ver mais, explorar mais, conhecer mais... (um dia eu volto!).

Nesse ano eu consegui voltar a ler alguns dos trocentos livros que eu compro compulsivamente como se não houvesse amanhã (claro que não li nem a metade, mas já estou no caminho! rs), passei a andar mais de transporte público e, consequentemente, observar mais as pessoas que moram nessa cidade imensa. Consegui refletir um pouco mais sobre as minhas escolhas, apesar de isso não querer dizer que cheguei a alguma conclusão... Fui mais ao cinema, revi amigos queridos que eu nunca tinha tempo de ver. Viajei mais para a praia, aproveitei mais a companhia da minha família. Tentei mudar alguns hábitos, passei a ir para a academia de ginástica regularmente, quis ser uma pessoa mais saudável.

Apesar de ter sido um ano rico em aprendizados e desafios, posso dizer com segurança de que o meu maior desafio está sendo passar esse final de ano com a confiança de que tudo vai ficar bem em 2015 e de que sim, eu vou me curar. De repente o Universo te vira do avesso e chega a hora de parar e realmente refletir sobre o que você anda fazendo ou deixando de fazer. Foi um final de ano difícil, não tenho como negar isso. Tive que aceitar uma nova condição que a própria vida me impôs. As mudanças físicas virão, mas as emocionais são por minha conta.

Como escrevi há algum tempo atrás: "não sabemos o quão forte somos até que, de fato, precisamos ser" e realmente não fazemos ideia dessa força que existe dentro de nós (ou, ao menos, eu não fazia ideia dessa força). Descobri como nesses momentos um olhar amigo, um abraço forte, uma palavra de conforto ou uma simples mensagem perguntando "como você está" fazem muita diferença. Também percebi que, infelizmente, nem todo mundo é tão bacana quanto eu achei que fosse, mas tenho certeza que isso também é parte do aprendizado.

Adotei um novo mantra para a minha vida, "viver um dia de cada vez". Pode parecer bobo, mas, para mim, tem feito um bem imensurável pensar assim. Logo eu que sou uma pessoa extremamente ansiosa e agitada, tive que parar de planejar e realmente viver o que tenho para viver no dia de hoje, sem me preocupar com o que vai acontecer amanhã. Não, não é fácil, mas estou aprendendo. Estou aprendendo também a ser um pouco mais otimista e tentar encarar os fatos com uma maturidade que eu nem sei se eu tinha antes. Aprendi a dar um novo significado à palavra "família" que, muito mais que pessoas ligadas por laços de parentesco, são aquelas pessoas que aconteça o que acontecer, custe o que custar, estão lá por você. Engraçado como no final do dia cada um com o seu jeito e suas convicções se torna uma peça de um quebra-cabeças onde cada qual tem sua importância e se encaixa de maneira perfeita.

Enfim, foi um ano de experiências incríveis, de conhecer (e re-conhecer) pessoas. Ano de aprendizados, desafios, aproximações, muitas alegrias, mas também de muitas lágrimas. E eu agradeço por cada momento passado, cada reflexão, cada aprendizado. Não importa quantas lágrimas ainda virão aos meus olhos, eu sempre vou tentar vestir o meu melhor sorriso e encarar tudo de frente, do jeitinho que tiver que ser.

Que venha 2015!

Monday, December 08, 2014

"Vai ficar tudo bem"

Entre sorrisos soltos, lágrimas escorreram dos meus olhos, sem que eu tivesse o menor controle sobre elas. As lágrimas traduziam a minha surpresa diante dos novos fatos que me foram apresentados. Minha mãe, sentada ao meu lado e já sabendo de tudo muito antes de mim, segurava uma das minhas mãos entre as suas duas mãozinhas e a apertava na medida em que eu chorava. Ela me dizia muitas coisas, mas eu só conseguia ouvir (e dizer para mim) "vai ficar tudo bem".

Foi mais que uma surpresa, um completo choque. Você não imagina que determinadas coisas acontecerão com você até que elas, de fato, acontecem. E podem acontecer com qualquer um, você sabe disso, mas jamais está preparado para tal.

Naquela noite, há exatas duas semanas atrás, fiquei cercada pela minha família. Foi uma noite difícil. Uma noite sem fome em que eu precisava mastigar e digerir toda a informação recebida. Uma noite longa, cheia de reflexões involuntárias. A distração era praticamente impossível diante do cenário. Depois que todos dormiram, fiquei só, sem sono, sem saber o que pensar exatamente. Milhões de pensamentos passam pela cabeça e, ao mesmo tempo, existe um vazio inexplicável. Uma vida passa diante dos olhos. 

Apesar do susto, depois de duas longas semanas cheias de exames e visitas médicas, consigo pensar e conversar sobre o assunto com tranquilidade e, de quebra, ainda fazer algumas piadinhas sem graça para não deixar tudo ainda mais pesado que é. Nessas duas semanas também descobri que tem muita gente querida que torce por mim no matter what que eu sequer poderia imaginar. Pessoas que me conhecem há anos ou que eu simplesmente encontrei uma única vez na vida me mandam mensagens lindas e energias positivas sem fim. Não há palavras para agradecer tanto amor e carinho em forma de palavras, é tudo realmente muito especial.

E assim vou dando mais um passo nessa vida, tendo mais um aprendizado, estreitando ainda mais alguns laços. É tempo de refletir, de passar a enxergar algumas situações com outros olhos e a dar valor ao que importa de verdade. Não vou mentir que existe em mim um certo grau de medo, afinal, é complicado lidar com o desconhecido, mas, ao lado do medo, também existe uma certeza: "vai ficar tudo bem".

Sunday, August 10, 2014

Felicidade é ter um pai assim!

É teimoso, cabeça dura. Ciumento, possessivo, protetor. Adora ver a lua e estar perto do mar. Extremamente família, daqueles que faz tudo o que pode (e o que não pode) por todas nós. Canceriano, não podia ser diferente... É trabalhador, honesto, dedicado, determinado. Pode estar cansado o quanto for, mas nunca mede qualquer esforço por nós. Sabe aquela pessoa que você pode ligar às 5h da manhã e ela já dorme de roupa só esperando a sua ligação pra não perder nenhum minuto e ir te buscar correndo? Isso quando essa mesma pessoa não dá carona para seus amigos enquanto o sol já está raiando. Repete inúmeras vezes uma estória e fica bravo se você reconta a estória toda antes de ele terminar. 

É brincalhão, pentelho, piadista. Canta New York, New York como ninguém. Teima em dizer que é mais alto que eu, mas depois desiste dizendo que o problema é que sou "pernalonga"... Brinca com todo mundo, sem exceção, seja alguém conhecido ou não. E quando aparece pra contar uma piada pra gente? Ele já começa a rir antes mesmo de terminar de contar a piada e, apesar de não entendermos um cazzo, rimos junto da risada dele. Por outro lado, é preocupado demais está sempre trabalhando, não importa o dia da semana, como se não houvesse amanhã. 

Aos domingos de Fórmula-1 ele acorda cedo e se põe a assistir a corrida. Quer, de qualquer forma, que qualquer um que estiver pilotando a Ferrari ganhe só pra ele poder cantar o hino da bella Itália ao final. Aumenta o volume da tv o quanto pode e, com a mãozinha no peito, canta o hino como manda o protocolo. Alguns dizem que ele tem cara de mafioso, mas a gente sabe bem que é só a cara (e olhe lá). Veio para o Brasil com meses, mas continua sendo o italiano mais italiano que eu conheço e todo esse amor foi transmitido para nós: passamos a amar a Itália como se nosso país fosse! E se não tivermos macarrão aos domingos, é como se a semana não tivesse tido um domingo. Posso chegar a hora que for, ele sempre vai perguntar se eu comi e se eu não quero um macarrãozinho. 

Fica bravo quando estamos tristes, afinal, não sabe lidar muito bem se uma das suas quatro mulheres está cabisbaixa. Fala firme, não gosta de nos ver chorar. Pode estar ocupado o quanto for, mas se eu tiver um problema, ele vai largar tudo para me ouvir e me acalmar. E é incrível como ele sempre tem uma palavra de conforto que cai como uma luva. 

Os anos passam, mas é como se ainda fôssemos as meninas do papai. Talvez nunca deixaremos de ser, essa é a verdade. Eu poderia escrever inúmeras linhas que, ainda sim, não caberia tudo o que tenho a dizer sobre ele. É meu orgulho, minha fonte de inspiração, minha fortaleza. Alguém em quem eu posso confiar e que sei que posso contar a qualquer hora, em qualquer lugar. Uma pessoa iluminada, com um coração enorme e que não me deixa desistir do que realmente vale a pena.

Obrigada, pai, por ser essa pessoa maravilhosa. Feliz dia dos pais!

Amo você.

Saturday, July 19, 2014

Diálogos do metrô

(*) Arquivo pessoal.
9:30 da manhã. Linha verde do metrô, uma sexta-feira como qualquer outra.

Ela senta no assento reservado e, sem pestanejar, coloca sua mão enrugada pelo tempo sobre uma das pernas da moça. Dá dois "tapinhas" na sua perna e diz, olhando nos seus olhos, "você é muito bonita!". Apenas para confirmar, olha para cima, para outra moça que está em pé "não é?".

A moça bonita, ainda que sem jeito, responde um tímido "obrigada", não conseguindo esconder o sorriso pelo elogio espontâneo daquela senhora.

Thursday, May 01, 2014

Ah, Londres!

(*) Arquivo pessoal.
Foto tirada em Londres (abril/14)
Londres. Sempre linda e intensa. Mistura de sentimentos, vontade de não ir embora. Cheia de movimento seja no vai-e-vem dos skates perto do Tâmisa seja nas feirinhas de Bricklane. Cheia de cores e formas. Grafites colorem suas paredes mais sérias. Os tradicionais tijolos formam um lindo contraste com os arranha-céus envidraçados. Cada vez uma experiência. Cada vez uma estória escrita de maneira diferente.

O amor sempre vem e a vontade de não deixá-la pra trás tão cedo também.

(*) Texto escrito em 16/04/2014, em Londres.

Saturday, April 05, 2014

Lá vai Cristina!


Passaporte, passagem, dinheiro. A hora de ir embora novamente chegou. Sempre com o coração batendo forte, a ansiedade apertando, espero o meu vôo. Mais um pra conta, mas nunca como o último, nunca como o próximo. Porque uma viagem é muito diferente da outra. Não importa os fins (se férias, se trabalho, se lua-de-mel, se intercâmbio), cada uma é única. Não importa quantas vezes já fui e quantas vezes ainda irei (porque,  por óbvio, não pretendo parar tão cedo), sinto uma nova emoção a cada vez. Continuo detestando arrumar malas (dessa vez, confesso, deixei pra última hora literalmente) e continuo amando desbravar mais um cantinho do mundo!

A vida é curta pra gente viver só de preocupação, de trabalho e de espera... assim, prefiro viver preocupada com o meu próximo destino, minha próxima parada e minha próxima vida, pois acredito que Cristina sempre vai, mas nunca volta a mesma!

Thursday, March 27, 2014

Meus dois mundos

(*) Ilustração por Fabi Savino

Vivo em dois mundos. Vivo dividida em duas. Fico entre meu coração e a minha razão. Entre as letras e as leis. Meus mundos se complementam em certos momentos, mas se dividem em tantos outros. O coração bate forte e a saudade aumenta cada vez que escuto o nome da primeira faculdade. Revejo matérias, me arrependo de não ter aproveitado mais. O meu "erro" foi ter entrado na faculdade tão cedo, tão menina.

A grande verdade é que eu nem imaginava que ia entrar assim, logo depois do colégio. Pensei sinceramente que meu intercâmbio para o exterior no meio do colegial "atrapalharia" essa fase de vestibular e afins (não sei trigonometria até hoje e olha que eu gostava de matemática). Sempre gostei de gramática, de sistematizações, da praticidade (boa capricorniana)... mal sabia eu que estava entrando em um mundo completamente diferente do que eu conhecia até então, ao qual fui me entregando aos poucos. Não aproveitei o primeiro, tampouco o segundo ano. Era novinha demais, nem sabia onde estava meu próprio umbigo. Pensei em desistir um ano, esperei outro e, quando dei por mim, já estava no terceiro! Comecei a abrir os olhos e rever os meus conceitos. Minhas visões limitadas sobre o mundo mudaram (e muito!), passei a rever escolhas e a escutar mais o que tinham pra me dizer. Claro que muito do que deveria ter sido absorvido ainda não foi, mas fato é que foi um passo importante no meu crescimento pessoal.

Convivi com pessoas muito diferentes das que estava acostumada no meu dia-a-dia. Pessoas de diferentes lugares do Brasil, carregando experiências e vivências que só me acrescentavam de diversas formas. Algumas pessoas incríveis que ainda permanecem na minha vida (ainda bem!) e outras que, infelizmente, perdi o contato, mas que ainda penso, lembro e tenho carinho.

Minha segunda escolha foi um pouco mais consciente. Não que a primeira não tenha sido, mas quero dizer que eu estava um pouco mais madura, já tinha passado por uma experiência, me formado e acabei fazendo uma escolha um pouco mais "consciente" em comparação aos meus 17 anos. Contrariando - e muito - a primeira, eu me encontrei entre as leis e a dureza do Direito. Todo o sistema e a praticidade (aparente) se despertaram em mim novamente. Desde o dia em que optei cursar Direito, meus caminhos se enveredaram todos por essa avenida. Abandonei minhas aulas e meus projetos em busca de novos objetivos que deram (e ainda estão dando) certo. No entanto, ainda sim, não deixo de me encantar com os meus amigos professores de português, história, sociologia, geografia e todos aqueles que amam sua profissão. Fico fascinada quando contam estórias das salas de aula das escolas Brasil afora e sempre me lembro da pouquíssima, porém enriquecedora, experiência que tive com alunos de 7a. e 8a. séries. E tenho saudade, não posso negar. Lembro que foi nesse momento que me dei conta do tamanho da responsabilidade de um professor dentro de uma sala de aula. Eu estava ali, formando conceitos e pessoas para o mundo. Isso só pode ser, no mínimo, genial!

Às vezes, confesso, até tenho repentes de voltar a estudar literatura e história, mas a falta de tempo e o cansaço acabam me vencendo e eu abandono a ideia. A profissão que escolhi exige muitas leituras e estudos e acabo me penitenciando por não ter o tempo que gostaria pra me dedicar mais.

Mesmo amando o que eu faço hoje em dia (e só aqueles que acompanham de perto sabem o quanto amo) e não me arrependo nem por um momento de ter percorrido todo esse caminho para, finalmente, me "encontrar", sinto muita, mas muita saudade dos tempos da Letras e de tudo que aquela faculdade conseguiu me proporcionar.

Viver dividida em dois corações e duas razões não é fácil, mas me sinto privilegiada por ter podido vivenciar tantas experiências maravilhosas com olhares tão diferentes sobre os mesmos aspectos.

Saturday, March 08, 2014

Estórias de Alice

Alice tinha vontade de se apaixonar novamente. Nem se lembrava quando havia sido a última vez. Sentia falta de sentir o coração parar por alguns segundos (e das palpitações sem fim que viriam em seguida), do frio na barriga, de ver o mundo com lentes coloridas na maior parte do tempo (se não o tempo todo).

Era romântica pra caramba. Tentava esconder esse fato até dela mesma, mas, no fim, cansou de remar contra a maré e achou que devesse se assumir do jeito que era para o mundo. Sou romântica mesmo, e daí?, falou para a amiga que a escutava pacientemente na mesa do bar. Queria romance, queria amor, queria planos juntos, musiquinhas bregas e tudo o que tinha direito.

(*) Foto por Álvaro Roxo (1000imagens)
Queria, queria, queria, mas estava um pouco cansada de procurar. Busca eterna e infinita, meudeusdocéu. Achava que nunca encontraria um cara legal para, ao menos, sair de vez em quando e fazer programinhas juntos. Esse mundo anda muito difícil: uma hora você é oferecida, outra hora você é desinteressada... como faz?. Não faz, Alice, deixa que façam. Quem quer, faz.

Quem quer faz? Faz. E ele fez. Ele a chamou pra sair. Eeeeee! Ela não se aguentava de tanta felicidade. Tanta que passou horas entre o chuveiro, o armário e o espelho só pra escolher uma roupinha para o "grande encontro". Eles tinham se conhecido em um casamento (Alice, como boa romântica que era, adorava casamentos). Ela já estava acostumada a ficar sozinha nos casamentos dos amigos que nem percebia muitas coisas ao seu redor. Até que percebeu e não se arrependeu.

Naquele sábado, porém, caprichou no visual - nada muito carregado, nada muito sóbrio -, colocou seu melhor perfume e saiu. Não sabia o que ia encontrar além dele, mas, no fim, nem se importava, afinal ia vê-lo novamente e só isso, na sua humilde opinião, já era uma vitória.

Vitória? Sim, explico: Alice vinha de uma maré de decepções atrás de decepções - um que era amigo, mas que não falou mais com ela depois de um micro-rolo-intenso-de-verão. Outro que saiu com ela algumas vezes e, "do nada"(pra ela), começou a namorar. Com outra, claro. Outro que só procura de tempos em tempos para dar uma garantida de que ela ainda está lá, solteira, supostamente infeliz e para dar uma "mijadinha no poste", afinal, cachorro que é cachorro mija em todos os postes da rua para assegurar o seu posto. O outro que tinha 15 anos de mentalidade e ela não sabia mais o que fazer pra despistar. Pois é, pois é... "poor Alice".

Diante disso tudo, não se furtou de pensar: agora é a minha vez de ser feliz. O cara é ótimo!!. Morreu de vergonha por alguns minutos, mas, depois, tudo entrou nos eixos. Já havia se enturmado com o pessoal da mesa, estava quase "se sentindo em casa". Ele, um fofo, fazia de tudo pra ela ficar à vontade. Ela, uma fofa, fazia de tudo pra se libertar da vergonha infinita. E foi ótimo!

Mas aí os dias passaram. Trocaram algumas mensagens fofas (um adendo necessário aqui: Alice quase morreu com uma mensagem recebida dizendo que "estava com saudades". Vamos combinar que um "saudade" é QUASE uma declaração de amor em determinadas situações nos tempos de hoje. Não é, eu sei, você sabe, Alice sabe, mas é um QUASE e um "quase" já é uma grande coisas no mundo de Alice). Ela se encantou, se empolgou de novo e as palavras saíram correndo dos seus rápidos dedinhos.

Depois de um tantinho de tempo, os fofos resolveram se encontrar novamente. Eeeeee! Ele sugeriu de se verem e Alice já ficou toda animada. Não fez mais nada no dia marcado a não ser esperar e, claro, pensar na roupa, no cabelo, no sapato, na vida. Esperou mensagem, ligação, sinal de vida, fumaça, bolhinha de sabão. Decidiu que não seria mal nenhum mandar uma mensagem e... nada. Telefonou (será que ele foi atropelado? parada cardíaca? sequestro relâmpago? levaram o celular embora CERTEZA!... a mente de uma mulher pensa sempre nas mais loucas possibilidade e finge acreditar em cada uma delas para alívio imediato da não correspondência).

Alice não aprende mesmo. Já decepcionada (outra vez?) recebeu uma mensagenzinha no dia seguinte (não, ele não tinha sido atropelado, sofrido parada cardíaca, etc, etc) e resolveu que ele não era tudo aquilo. Ficou triste por uma semana e não mais pronunciou o seu nome para as amigas, as amigas das amigas e para qualquer outro ser com quem ela quisesse dividir a felicidade de ter encontrado um cara bacana. Desacreditou mais uma vez na possibilidade de encontrar alguém pra lhe fazer companhia. Comprou uma passagem, tirou férias e foi embora pra Europa ser feliz.

PS: tempos depois Alice ficou sabendo que ele tocou a sua vida, como devia ser: mudou de emprego, parou de fumar, comprou um cachorro e se mudou para uma casa confortável com a sua atual esposa.

Sunday, January 26, 2014

Over coffee

Ele apareceu no meio de uma tarde para um café. Estava esperando ela descer para encontrá-lo. Ela, por sua vez, precisava vê-lo, precisava do seu amigo. Fez um apelo por mensagem e foi atendida. 

O reencontro: um abraço longo de dois braços e uma lágrima querendo escorrer dos olhos dela.

(*) Arquivo pessoal. Foto por Fabi S.
Foram andando até um café gostoso perto do seu trabalho. Conversaram sobre novidades, expectativas para o futuro próximo e, inevitavelmente, tocaram na ferida... afinal, não era pra isso que estavam ali? Ele não tinha se deslocado pra "nada".

Ela anda magoada e ele sabe bem disso. Ela não consegue traduzir as coisas que sente em palavras... ou até consegue, mas não queria desabar ali, em frente aos seus olhos. Não ali, não naquele momento.

Olha para o "nada", fala muitos "sei lás", deixas frases interminadas no ar. Ele a observa por trás das suas lentes e, após ouvir suas cortadas lamentações, pega sua caneta e um guardanapo dobrado. Sem mais, dá o seu veredicto: "overthinking".

Você pensa demais, disse ele.

Ela pensa. Repensa. Cria e recria hipóteses em seu mundo interior. Pensa tanto e, ainda sim, jamais chegou nessa conclusão. Como pode?

O café terminou, hora de ir. Com o coração mais leve, a cabeça mais fria, só conseguiu pensar que, às vezes, só falta um olhar diferente para conseguirmos enxergar um outro ângulo das coisas.



Tuesday, December 31, 2013

Um pra lá, um pra cá

(*) Araçatuba, 2013. Arquivo pessoal.
Entre uma bebida e uma brincadeira despretensiosa, ele a chamou pra dançar. Sorriam um para o outro enquanto ela o seguia para a pista de dança. Dançariam qualquer música que estivesse tocando, não importava o ritmo. Ele de sapatos, ela de chinelos.

Seus rostos tocavam-se como de brincadeira. Um passo aqui outro acolá, risadas fáceis. Seus olhos claros encontraram os tímidos olhos dela. 

Não sabia muito bem, mas não precisava saber. Entre um passo e outro, um beijo. E todas as suas dúvidas se dissiparam... como mágica.

Tuesday, December 10, 2013

Stop this train

De repente a correria diminuiu. Os batimentos desaceleraram, os pensamentos tiveram mais espaço, os olhos se encheram de novas cores, pessoas, ruas. 

De repente tive vontade de andar de bicicleta de novo, de conversar com a família, de rever pessoas queridas que estão sempre distantes. Tive vontade de viajar, de pesquisar cursos novos, de cuidar de mim. Tive vontade de viver "de verdade". As vontades ganharam novo espaço na minha vida.

O tempo passa rápido demais, as coisas mudam, a gente muda de dentro pra fora, de fora pra dentro. De repente percebo como andei perdendo tempo tentando manter pessoas na minha vida que nada me acrescentam. E, às vezes, deixando de lado aquelas que tinham muito a acrescentar.

Pensei que mais uma vez meu aniversário está chegando e eu só não quero mais repetir comportamentos. Quero poder errar erros novos, enxergar o mundo diferente e acho que tenho conseguido ao menos um pouco disso nos últimos meses... mas ainda não é suficiente: quero mais! 

Não conseguimos parar o trem: ele continua seguindo seu caminho. O trem não pára, mas nunca é tarde para tentar mudar de vagão...
(*) Expresso do Oriente, Istambul, 2013. Arquivo pessoal. 

"Stop this train
I want to get off
And go home again
I can't take the speed it's moving in
I know I can't
Cause now I see I will never stop this train..."

Friday, September 13, 2013

Antes do Amanhecer

(*) "Armageddon", por Álvaro Roxo
(
www.1000imagens.com)
O que a gente tem
Tem significados diversos
Impossíveis de traduzir em palavras

Um gole, uma verdade engasgada
Conversas paralelas e nada superficiais
(nunca serão)
Lembranças, novidades.
O tempo passa rápido sem que a gente perceba
Que tanta coisa mudou
(até mesmo os sentimentos de mágoa)

Separados apenas por uma mesa
Os braços procuram
As mãos se encaixam
E no tímido entrelaçar dos dedos
Um mundo de possibilidades
(que se desmancha aos poucos
junto com a chegada do amanhecer)

É quando seu olhar encontra o dele
Que as vontades se refazem e retomam aquele espaço
Que ficou perdido por tanto tempo

Um sorriso delicioso é arrancado dos seus lábios
Segredos despidos de juras de amor são contados ao pé do ouvido
Um beijo na testa, uma confissão.

Seus olhos brincam e seus lábios se encontram
Em um ritmo desacelerado, re-conhecido
Como se fosse a primeira vez...