Thursday, March 27, 2014

Meus dois mundos

(*) Ilustração por Fabi Savino

Vivo em dois mundos. Vivo dividida em duas. Fico entre meu coração e a minha razão. Entre as letras e as leis. Meus mundos se complementam em certos momentos, mas se dividem em tantos outros. O coração bate forte e a saudade aumenta cada vez que escuto o nome da primeira faculdade. Revejo matérias, me arrependo de não ter aproveitado mais. O meu "erro" foi ter entrado na faculdade tão cedo, tão menina.

A grande verdade é que eu nem imaginava que ia entrar assim, logo depois do colégio. Pensei sinceramente que meu intercâmbio para o exterior no meio do colegial "atrapalharia" essa fase de vestibular e afins (não sei trigonometria até hoje e olha que eu gostava de matemática). Sempre gostei de gramática, de sistematizações, da praticidade (boa capricorniana)... mal sabia eu que estava entrando em um mundo completamente diferente do que eu conhecia até então, ao qual fui me entregando aos poucos. Não aproveitei o primeiro, tampouco o segundo ano. Era novinha demais, nem sabia onde estava meu próprio umbigo. Pensei em desistir um ano, esperei outro e, quando dei por mim, já estava no terceiro! Comecei a abrir os olhos e rever os meus conceitos. Minhas visões limitadas sobre o mundo mudaram (e muito!), passei a rever escolhas e a escutar mais o que tinham pra me dizer. Claro que muito do que deveria ter sido absorvido ainda não foi, mas fato é que foi um passo importante no meu crescimento pessoal.

Convivi com pessoas muito diferentes das que estava acostumada no meu dia-a-dia. Pessoas de diferentes lugares do Brasil, carregando experiências e vivências que só me acrescentavam de diversas formas. Algumas pessoas incríveis que ainda permanecem na minha vida (ainda bem!) e outras que, infelizmente, perdi o contato, mas que ainda penso, lembro e tenho carinho.

Minha segunda escolha foi um pouco mais consciente. Não que a primeira não tenha sido, mas quero dizer que eu estava um pouco mais madura, já tinha passado por uma experiência, me formado e acabei fazendo uma escolha um pouco mais "consciente" em comparação aos meus 17 anos. Contrariando - e muito - a primeira, eu me encontrei entre as leis e a dureza do Direito. Todo o sistema e a praticidade (aparente) se despertaram em mim novamente. Desde o dia em que optei cursar Direito, meus caminhos se enveredaram todos por essa avenida. Abandonei minhas aulas e meus projetos em busca de novos objetivos que deram (e ainda estão dando) certo. No entanto, ainda sim, não deixo de me encantar com os meus amigos professores de português, história, sociologia, geografia e todos aqueles que amam sua profissão. Fico fascinada quando contam estórias das salas de aula das escolas Brasil afora e sempre me lembro da pouquíssima, porém enriquecedora, experiência que tive com alunos de 7a. e 8a. séries. E tenho saudade, não posso negar. Lembro que foi nesse momento que me dei conta do tamanho da responsabilidade de um professor dentro de uma sala de aula. Eu estava ali, formando conceitos e pessoas para o mundo. Isso só pode ser, no mínimo, genial!

Às vezes, confesso, até tenho repentes de voltar a estudar literatura e história, mas a falta de tempo e o cansaço acabam me vencendo e eu abandono a ideia. A profissão que escolhi exige muitas leituras e estudos e acabo me penitenciando por não ter o tempo que gostaria pra me dedicar mais.

Mesmo amando o que eu faço hoje em dia (e só aqueles que acompanham de perto sabem o quanto amo) e não me arrependo nem por um momento de ter percorrido todo esse caminho para, finalmente, me "encontrar", sinto muita, mas muita saudade dos tempos da Letras e de tudo que aquela faculdade conseguiu me proporcionar.

Viver dividida em dois corações e duas razões não é fácil, mas me sinto privilegiada por ter podido vivenciar tantas experiências maravilhosas com olhares tão diferentes sobre os mesmos aspectos.

2 comments:

Guilherme Lichand said...

adorei, Fe! Nos "perdermos" para nos encontrar, e quem nunca deu um salto no escuro é chato demais, né? =)

Beijos,

Bêlo

Lucas M said...

Acho que são poucos os advogados que não andam divididos pelo mundo.. Gostei muito, e mais ainda de saber q vc ainda escreve tão bem! Beijos